terça-feira, 3 de setembro de 2013

A Impermanência do permanente caos


Os brinquedos junto aos processos, os desenhos de colorir e a caixa de lápis de cor em frente ao computador denunciam presença diferente no expediente inóspito do labor cotidiano, ainda que seja de onde vem o ganha pão, pra ele o lugar é um parque de diversão, as cadeias giratórias viram logo um carrinho ou um avião e os elásticos de processos são a faixa perfeita para caracterizar o ninja.
O dia começou cedo e foi bem cheio. Reflito a caminho de casa sobre os acontecimentos idos. A memória me remete a palestra do dia anterior, sobre a velocidade dos tempos, a dinâmica da historia, transformação da sociedade e a impermanência da vida.
Fomos a uma sessão de terapia infantil. Tudo muito lúdico e colorido. Confesso alguma dificuldade em entender os conflitos ou os problemas existenciais de crianças de 0 a 7 anos, principalmente porque acredito que os filhos acabam sendo o reflexo da nossas frustrações, da nossa ansiedade, daquela tristeza que carregamos nos olhos, mesmo quando o abraço mais carinhoso nos envolve o corpo. 
Pra ele foi à continuação do parque de diversão do período da manhã. Pra mim é desconcertante, mas é preciso entender as lacunas que não consigo preencher ou saber se fui eu quem as abriu em coração tão frágil. Outras crianças, outras mães, outros problemas que eles me fazem pensar: se a vida é impermanente porque estamos ali?
Tudo haverá de passar, isso é tão certo quanto o tempo é imprevisível. Como viver a incerteza temporal? Se considerarmos a impermanência da vida e a minha própria natureza, que precisa entender pra viver plenamente, mais fácil seria enlouquecer junto com o mundo. Ta aí, talvez seja uma solução.
Fico vendo a velocidade dos carros pelo vidro do ônibus, enquanto ele dorme tão tranquilamente. É um contraste e tanto, dentro do caos em que transita a vida urbana em qualquer hora do dia ou da noite, ele simplesmente dorme.
Contrastando com a palestra de ontem, tenho a sensação que minha vida gira em torno do permanente. Nas relações que vamos estabelecendo um com o outro a cada dia, nas coisas que vamos aprendendo juntos: eu a paciência em ouvir todas as histórias e ele em me ver atrasada todas as manhãs. Permanente são o compromisso e responsabilidade que a maternidade impõe a quem pariu.
Eu e ele. Permanentemente juntos. A companhia de todas as horas, no mercado, na praia, na novela, nas refeições, nas dificuldades cotidianas...
Hoje uma amiga falou que está ficando velha pra esse mundo de coisas tão absurdas. Eu concordo com ela, mas enquanto eu também envelheço, ele cresce exposto nesse mesmo mundo de coisas a cada dia, mais e mais absurdas, com o agravante que é impossível não deixa-lo crescer ou tomar contato com essa realidade.
Da impermanência do permanente caos, fica a necessidade de estar permanentemente ligada às pequenas coisas, como o cultivar o amor, regar a cumplicidade, afinar a confiança e podar os limites da condescendência, para simplesmente sobrevivermos.
Poder colher flores e frutos de um relacionamento sólido e saudável, coisa tão rara no cotidiano que não nos permite ser, nem estar inteiros de verdade, é coisa pra poucos e corajosos, que contrariando impermanência da vida permanecem fies ao mel e ao fel  daqueles que amam.

T.